domingo, 24 de junho de 2012

"Sei que faz parte, mas não deixo de ficar triste.”

"Acredito que errado é aquele que fala correto e não vive o que diz."

Cheguei a porta da sala da senhora Vaughn, mas não entrei, continuei ali na porta entreaberta, imaginando o que ela queria poder comigo. Ela não estava sozinha, havia uma outra pessoa, uma moça, por volta dos trinta e poucos anos, eu diria, toda vestida de branco. Não gostei daquilo. Todos sabiam, principalmente a senhora Vaughn, dos meus últimos surtos e alucinações, e uma mulher vestida de branco não poderia ser bom sinal.

"Entre Lizzie" A senhora Vaughn me chamou, no instante em que percebeu que eu estava lá. Estranhei principalmente o fato dela estar me tratando pelo apelido, devia ser pena, ou sei lá o que, culpa por estar me mandando para o sanatório. "Não se acanhe, quero que conheça uma pessoa." Ela insistiu, e eu não tinha escolha, sair correndo e pedindo socorro pelo corredor não provaria muito que minha saúde mental continuava boa.Adentrei, mas não me acomodei ao lado da moça loira, que continuava a me encarar como se me analisasse. Eles acham muito que entendem a mente humana. Resmunguei mentalmente. E por um instante tive a impressão de que a mulher loira sabia o que eu estava pensando, algo me dizia, pela maneira que ela ainda me olhava e a forma como o sorriso dela se abriu, discretamente. Tive calafrios, só de pensar isso. "Bem, Doutora, está é uma de nossas melhores alunas, Lizzie...e...Lizzie está é a Doutora Maddox. E vou deixá-las a sós, ela gostaria de ter uma palavrinha com você." Vi ambas trocarem olhares, e suspirei, com medo do que se seguiria. Assim que a senhora Vaughn saiu, me acomodei em uma das outras cadeiras, vendo que não me sobrara opção.

Nos mantivemos olhando em silencio por alguns minutos, como se ela esperasse por eu começar,mas eu não ia começar nada, eu queria era fugir de lá.

"Boa tarde, Lizzie..." Ela começou a falar, mas logo pausou. Me encarava, e algo nas orbes azuis me trazia receio. "...posso chamá-la assim, não é?" Ela dizia simpática.

Concordei com a cabeça, mas não respondi ao boa tarde. Passara muitos anos da minha vida em terapia, e foi exatamente por causa de um terapeuta que eu estava naquele colégio, então eu não tentaria ou responderia a alguma forma de aproximação. 

"Vamos lá, querida! Eu preciso que colabore..." Não diria exatamente que ela tinha a voz doce e acolhedora, mas ela tentava.

Me mantive calada, desviando os olhos para a mesa da senhora Vaughn.

"Não quer me falar um pouco sobre você?!" Ela perguntou mais uma vez, e neguei quase no mesmo instante com a cabeça.Vi ela remexer na bolsa e na pasta, de forma inquieta na cadeira. "Vamos fazer assim...você só me responde o que achar necessário?" Concordei por fim, deixando-a me vencer.

K: "Como é seu nome inteiro?"

L: "Elizabeth Amy Campbell"

K: "Sua idade?!"

L: "Dezessete anos....dezoito em dois meses."

Ela havia tirado um monobloco e parecia anotar o que eu dizia.

K: "Há quanto tempo está aqui, querida?"

L: "Quase três anos."

K: "Prefere aqui a sua antiga casa?!"

Suspirei, cansada daquilo, mas fiz sinal de afirmativo com a cabeça. Apesar de ser uma pergunta difícil, considerando os últimos anos, qualquer coisa era melhor que meu pai.

K: "Algo te incomoda atualmente?!"

Me mantive em silencio, e ela provavelmente interpretou aquilo como um "sim", porque continuou.

K: "O que?"

Continuei calada, desta vez, encarando-a olho no olho. Depois de alguns minutos ela voltou a falar.

K: "Poderia desenhar?!"

Fiquei na dúvida por um instante, e aproveitando esse momento de incerteza ela me entregou uma folha do bloco e a caneta azul que ela tinha em mãos.

Não desenhei nada. Só escrevi no lugar. "Eu não quero falar sobre isso."  E estendi o papel a ela. A mulher loira concordou com a cabeça, e deu um suspiro.

K: "Vamos começar de novo então?!"

Quis gritar com ela, chorar, fugir. Mas eu sabia que isso só me acarretaria mais problemas, eu não queria falar, não queria falar porque me machucava, me fazia pensar em tudo que estava me atormentando, e como antes os pesadelos sobre meu pai, agora essas coisas me perseguiam, noite a noite. E não existia Paulie para me acalmar, como da outra vez. Aliás, existia Paulie, mas ela estava junto com eles, aparecendo e sumindo, só para me dar a dor de achar que tudo havia voltado, para no minuto seguinte eu me ver no fundo do poço novamente.

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