segunda-feira, 25 de junho de 2012

“Se meus olhos mostrassem a minha alma, todos, ao me verem sorrir, chorariam comigo…”



Já tive medo do escuro, hoje no escuro me acho… me agacho… fico ali…

Não tive outra escolha quando me chamaram. A opção mais viável que eu tinha, que era fugir e espernear que eu não era louca, só faria com que os que achavam isso tivessem mais crédito. Depois do incidente do refeitório, eu recebera notificação para ser dispensada das aulas do dia seguinte, e por isso não havia saído do quarto, quando finalmente coloquei os pés para fora rumo a sala improvisada da psiquiatra. Minhas mãos estavam geladas por medo, e por isso as mantive no casaco do uniforme. Segui os corredores e lances necessários até chegar na tal sala, mas me mantive na porta, na esperança de que de alguma forma, ela só me notasse lá quando tivesse esquecido o que queria comigo. Não era inocência de pensar isso, era desespero.


" Vamos, lá, Lizzie, querida! ...existe alguém aqui que quer vê-la..." 


Merda, ela havia me notado. Suspirei pesadamente, ainda hesitando em entrar, mantendo o livro que trazia comigo em mãos.


"Vamos lá, querida...acho que vai gostar da surpresa..." Eu ainda diria que aquela médica maluca ganharia o troféu de falsidade, mas me mantive calada. Dando apenas um passo a frente, e tendo a visão da sala, desta vez. 


"NÃÃÃÃÃÃÃO" Exclamei com a imagem que vi de relance, deixando o livro cair a frente de meus pés. Logo fechei meus olhos, levando minhas mãos também a eles, para impedir não cair do truque de ver. Era Paulie, mas eu não me convenceria que ela estava ali desta vez. Não, eu me manteria íntegra à minha saúde mental. Só faltavam dois meses para eu me formar, não surtaria agora, não podia surtar, ou até eu sairia do colégio, direto para o manicômio, ou pior.


"Sou eu, Lizzie....sou eu...Paulie, venha, minha garota...abra os olhos, eu estou aqui,...de verdade."


Eu não podia impedir a voz que chegava aos meus ouvidos. Tão verdadeira, tão Paulie...tão...


"Por favor, não..." Choraminguei.


"Abra os olhos, querida...vamos lá..." Ela insistiu, e pude perceber ela diminuir alguns passos entre nós. Fiquei com medo, fiquei com medo porque quando começava a aproximação era que se aproximava o final dos meus sonhos. "...vamos, minha menina..." Ela insistiu, e eu podia perceber o choro na voz dela.


E como quem se rendia, eu não poderia escutá-la chorar e ficar simplesmente ali, fosse um sonho ou não, era minha Paulie chorando. Fui abaixando minhas mãos, revelando meus olhos inundados em lágrimas. A encarei, com medo de dizer qualquer coisa.


"Sou eu...vê?...venha cá, me abrace...encoste em mim...sou eu...eu voltei..." Ela insistia, ainda em choro, que me fazia chorar ainda mais, ainda que fosse um choro contido, sem muito barulho, interrompido por um ou outro soluço.


"Por favor, vá embora antes que eu acredite que isso é real..." Pedi, como quem quase suplicava, eu não poderia chegar até ela, e me ver acordar novamente.


"Lizzie...vem meu amor..." Paulie chamou, e desta vez eu não resisti. Que a médica estivesse ali, que me achasse louca, que aquilo fosse uma alucinação ou um sonho, a  minha saudade e meu amor eram muito maiores do que meu medo de ser condenada a louca. Estiquei uma das mãos na direção de Paulie, encostando a ponta dos dedos no ombro dela, ainda com receio de que ela sumisse a qualquer instante. Mas ao invés de sumir, ela se aproximou, se aproximou e me abraçou, e meu choro desabou, sem preocupar em se conter. 


A abracei mais forte, implorando em sussurros no ouvido dela. "Não vá embora. Não vá embora. Não vá embora." Disse, choramingando, sem me afastar daquele abraço que a mim parecia tão verdadeiro e tão real como estivéssemos voltado dois anos no tempo.


"Eu não vou, eu não vou, eu não." Ela sussurrou a melhor coisa que eu poderia ouvir, a melhor coisa que eu poderia pedir. Afastei meu rosto, só um pouquinho, pra poder encará-la, e levei a pontinha dos meus dedos pelo rosto dela, reconhecendo os traços que eu tinha guardado em mim. Paulie sorriu, daquela forma que me encantara desde a primeira vez, e senti que ela me levantou do chão. Voltei a abraçá-la forte, e logo ela me apoiou em uma das mesas. E voltou a me encarar, ainda sorrindo, sussurrou para mim. "Eu estou loira...espero que ainda goste de mim assim..."


Sorri, em meio ao choro que era de felicidade, por finalmente vê-la, saber que ela estava bem. " Eu te acharia linda em um milhão de anos." Sussurrei para ela, tendo a certeza de que meus sonhos não eram de todo engano. Paulie estava com o cabelo da mesma forma que eu costumava ver, do mesmo jeitinho. Mas eu não estragaria o momento falando das minhas alucinações. Digo, eu não estragaria o momento...


"Seja o que for que estão fazendo não vai ser em cima da minha papelada!" Brandou a médica raivosa, arrancando os papéis que por acaso eu estava sentada em cima. Escorreguei da mesa, voltando a ficar em pé, e eu e P. trocamos olhares com risos cúmplices pelo estresse da médica. Foi como se tudo estivesse de volta...em seu devido lugar.


"Eu posso sair um pouco com ela?!" Escutei P. pediu a Kimberly, e aquilo era a melhor coisa que poderia me acontecer em tempos. Encarei também a médica, suplicando por dentro que houvesse alguma bondade nela.


"Hm..." Ela pareceu avaliar, e continuamos olhando na expectativa. "...desde que não saiam do prédio." Fosse por bondade ou não ela havia concordado.


 Paulie garantiu que eu estaria em segurança. E logo voltou-se para mim. "Amor, espera um pouquinho lá fora? Só preciso falar algo rápido com a médica..." Ela me deu alguns selinhos, e eu nem tive como negar, estava tão feliz, corri lá para fora, aguardando que ela viesse logo. Sonho ou não, essa era a realidade que eu queria para mim.

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